"O poeta é um fingidor. Finge tão completamente que chega a fingir que é dor a dor
que deveras sente."
Fernando Pessoa
No Teu Poema
- Carlos do Carmo
No teu poema
Existe um
verso em branco e sem medida
Um corpo que
respira, um céu aberto
Janela
debruçada para a vida
No teu poema
existe a dor calada lá no fundo
O passo da
coragem em casa escura
E, aberta,
uma varanda para o mundo.
Existe a
noite
O riso e a
voz refeita à luz do dia
A festa da
Senhora da Agonia
E o cansaço
Do corpo que
adormece em cama fria.
Existe um rio
A sina de
quem nasce fraco ou forte
O risco, a
raiva e a luta de quem cai
Ou que
resiste
Que vence ou
adormece antes da morte.
No teu poema
Existe o
grito e o eco da metralha
A dor que
sei de cor mas não recito
E os sonos
inquietos de quem falha.
No teu poema
Existe um
canto, chão alentejano
A rua e o
pregão de uma varina
E um barco
assoprado a todo o pano
Existe um
rio
O canto em
vozes juntas, vozes certas
Canção de
uma só letra
E um só
destino a embarcar
No cais da
nova nau das descobertas
Existe um
rio
A sina de
quem nasce fraco ou forte
O risco, a
raiva e a luta de quem cai
Ou que
resiste
Que vence ou
adormece antes da morte.
No teu poema
Existe a
esperança acesa atrás do muro
Existe tudo
o mais que ainda escapa
E um verso
em branco à espera de futuro